Confesso que os livros nacionais estão me encantando, os últimos 5 que li foram nacionais. E todos eu gostei.
Não conhecia essa autora, o livro traz a abordagem acerca da ausência conectando com a doença de Alzheimer. A gente passa a conhecer mais profundamente sobre a doença e seus efeitos devastadores. Mas diferentemente do que eu esperava, não se restringe meramente à doença, pelo contrário, aborda as diferentes formas de ausência e como cada uma delas interfere internamente nas pessoas, os conflitos que elas acarretam.
Daniel é um neuropsiquiatra, que diariamente lida com intermináveis tipos de transtornos da mente, mas em um dia que seria aparentemente igual a tantos outros se vê diante de um paciente acometido de uma doença que trouxe muita dor, angústia e traumas na vida dele, o Alzheimer. A partir daí ele volta ao passado, um passado que fez questão não de esquecer, mas de ocultar na sua vida por anos até o presente momento, que se vê encurralado sem ter mais como fugir a não ser encarar de frente seu passado.
Como ele mesmo reconhece, os médicos muitas vezes se consideram os detentores do saber, de forma que se tornam inatingíveis ou assim preferem se considerar. Mas na verdade buscando internalizar esse entendimento, se esquecem que são seres humanos, frágeis, suscetíveis a falhas, a dilemas internos como qualquer outra pessoa.
Ervin, era um professor renomado, casado com Margarida por muitos anos, que a todo tempo demonstra ser uma pessoa amargurada, sempre resmungando das falhas do marido e o criticando diariamente. Com a idade avançada passa a ter lapsos de memória, inicialmente tidos como "coisas da idade". Quando esses lapsos passam a ser frequentes, a família decide encaminhá-lo ao médico, Daniel. Ervin, durante o período em que lecionava não tinha muito tempo para a família, era ausente. Por esses e outros motivos que são descritos no decorrer do livro compreendemos a amargura da esposa.
Lidar com esse paciente, faz Daniel trazer à tona todos os fantasmas do passado e coloca em tela a sua vida atual, como o passado pode refletir no presente e no futuro se não soubermos lidar com os problemas, com as emoções, curar nossas "feridas", as feridas da nossa alma, como nos fechar pode nos levar a caminhos que não trazem a nossa felicidade.
O livro aborda a ausência física, de familiares, de pessoas que foram embora e como sempre acontece quando alguém que amamos nos deixa, um vazio se instala no nosso interior; a ausência psíquica, como o caso da avó dele, presente fisicamente mas ausente no seu intelecto, quem convive com um paciente de alzheimer sente a perda gradativa; e se não bastasse, sentimentos como raiva, incompreensão acompanham a todo tempo esse processo. O livro trata também da ausência do amor, da cumplicidade.
Uma passagem do livro fala assim: " Para mim, viver a verdade é dar espaço para a própria autenticidade". Isso mexeu comigo, quantas vezes criamos um personagem, deixamos de ser quem somos, perdemos nossa identidade. Daniel era casado com Milene ( odiei essa mulher a cada narrativa que ela tinha no livro, principalmente do "doutor"); ambos tinham condutas que ocasionaram no afastamento entre eles. Com isso, sentiam a "ausência" do companheirismo, do apoio, porque deixaram de praticar o diálogo, de expor seus sentimentos e angústias, afastando-se um do outro com o passar dos anos.
Daniel diante dessa ausência da esposa que Daniel sentia, se envolve com Natasha, filha de Ervin seu paciente com Alzheimer. Acreditando estar apaixonado; nela então ele encontrou algo que sentia falta e ela deu aquilo que ele considerava que precisava, o diálogo, a atenção. Ultrapassou os limites éticos da profissão e da moral, porque era casado e a mentira se tornou algo necessário para ele evitar mais problemas. Já percebeu que nunca estamos satisfeitos com o que temos? Pois é, o envolvimento dele com Natasha deixou ele transtornado, afetou ainda mais o casamento que já não ia bem. Não considerei o envolvimento com Natasha o motivo para a desestruturação do casamento entre Milene e Daniel; a culpa foi ter deixado que as situações incômodas fossem deixadas para traz, não ter trazido à tona, e ter fechado isso dentro de si, os dois erraram de não expressarem a verdade, e isso num relacionamento é fundamental.
Achei o livro com um final primoroso porque Daniel precisava entender os seus conflitos, se encontrar, para poder então dar valor as coisas simples da vida, e se dá conta que fugir dos problemas não resolve nada, só interfere no nosso crescimento pessoal.
Enquanto não estamos bem, não lidamos com nossas emoções e fraquezas nada dá certo efetivamente. Um namoro não dá certo, você não se dá bem com as pessoas a sua volta, o trabalho vai mal, tudo vai mal. É necessário lidar com todos os tipos de "ausência", não podemos depender do outro para sempre, não podemos condicionar nossa felicidade ao outro, não podemos culpar o outro pelos nossos erros, pelo nosso destino. Mas "culpar" a nós mesmos que tantas vezes não enfrentamos de frente o que nos incomoda por medo, por não vê que tudo o que passamos tem um propósito na nossa vida, que nos amadurece, fortalece.
Super recomendo o livro, nos faz refletir sobre muitas coisas na vida, pelo menos a mim, tocou profundamente.
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